A História de um Caso Estranho - Um estudo de ocultismo - Parte 1

    

Da esqueda para a direita: Professor James Hyslop, Elizabeth Blake, Dr. L.V. Guthrie and David P. Abbot

    No espiritualismo tudo é enganação e ilusão? Não há um mísero grão de verdade que possa ser encontrado nessa grande massa no qual um vasto exército de charlatães desgraçou ao longo do tempo? As pesquisas e esforços da Society for Psychical Research serão todos infrutíferos? Quando todas as fraudes e enganação forem eliminados, nada mais irá sobrar? Essas perguntas me fizeram inúmeras vezes. Qual será a resposta?
    Será que nenhum sussurro de esperança do além ecoa nos infinitos corredores das trevas? Será que as pálidas faces de nossos entes queridos, que assombram as brumas sombrias da memória, irão algum dia aparecer diante de nós na luz brilhante do dia? Voltaremos a ouvir as queridas vozes que a muito tempo foram silenciadas? Devemos nós, com passos vacilantes apoiados apenas pela fé cega, descer o abismo da morte na escuridão infinita do vale eterno? Devemos enfrentar a inevitável aniquilação da unidade do eu? Quando a ciência levanta sua tocha e perscruta ao redor na escuridão, não há um raio de esperança a ser visto? Irá surgir um novo amanhecer, com suas incontáveis canções de alegria explodindo das gargantas dos contentes pássaros cantantes? Oh, bela Natureza, como teus filhos te adoram! Oh, poder infinito, que anima e dirige o grande Todo, com este desejo insaciável de imortalidade nos corações de teus filhos!
    Já me questionaram inúmeras vezes se, em todas as minhas investigações, não encontrei nada que não pudesse explicar: se tudo o que encontrei foi demasiadamente simples e corriqueiro, se todo o mistério e romance desaparecem após a investigação. Finalmente resolvi certas dificuldades para publicação e agora apresentarei ao público um relato do caso mais notável que tive e foi uma grande sorte investigar. Entre todos os casos de minha investigação, ele se sobressai e é único, inteiramente um caso à parte; ainda até certo ponto envolto em mistério, com algumas características que ainda não expliquei completamente de forma satisfatória para mim mesmo. A memória dessa experiência notável e o efeito estranho e dramático do que superficialmente pareciam ser as vozes dos mortos falando comigo, e exibindo um conhecimento íntimo da história da minha família, permanecerão comigo por toda a vida.
    Em 7 de março de 1906, o mensageiro deixou em minha porta uma carta que estava destinada a perturbar minha paz de espírito e a  me fornecer muito material para reflexão por algum tempo. Pouco antes disso, eu havia publicado no jornal "The Open Court" um artigo intitulado "Some Mediumistic Phenomena"(Alguns Fenômenos Mediúnicos). Eu cheguei pensar vagamente se isso não traria indiretamente ao meu conhecimento alguns relatos de fenômenos estranhos de lugares remotos do mundo. Assim era esta missiva.
    Esta carta foi escrita por um cavalheiro de New Haven, Connecticut; e nela ele descreve um estranho caso que presenciou em uma aldeia remota um ano antes. O escritor, Sr. E.A. Parsons, era um desconhecido para mim; mas ele se apresentou como um mágico. Ele afirmou que depois de ler meu artigo, notou meu conhecimento sobre truques e charlatanismo, e desejava expor este caso para mim, na esperança de que eu pudesse explicá-lo. Cito aqui suas cartas:
    "Vou descrever uma experiência que tive com uma senhora idosa em uma pequena cidade em Ohio no ano passado. Ela usa duas cornetas ou trombetas, cada um com quatorze polegadas (35,5 cm) de comprimento e duas e meia (6,35 cm) polegadas de diâmetro nas pontas largas, afinando a uma polegada nas extremidades menores. A extremidade larga ou boca de um a das trombetas é colocada de modo a se encaixar firmemente na extremidade larga da outra. Nas extremidades menores ou externas desta trombeta dupla, são soldadas peças elípticas, grandes o suficiente para cobrir o ouvido de uma pessoa. A trombeta é vazia e pode ser examinada por qualquer um.
     Seu  poder maravilhoso é este: uma pessoa sentada pega uma ponta da trombeta e a coloca no ouvido, enquanto a senhora faz o mesmo com a outra ponta, colocando-a em seu ouvido. Imediatamente, a pessoa sentada ouve claramente sussurros vindos da trombeta. Dizem ser as vozes dos espíritos de seus amigos e parentes falecidos. Eles respondem a todas as perguntas que forem feitas em em voz alta pela pessoa. Durante esse tempo, a boca e os lábios da senhora estão bem fechados e ela não faz nenhum movimento com a garganta ou com os lábios. Ela também pode, em vez de segurar a trombeta junto ao ouvido, colocar a palma da mão contra ela; ou permitir que a pessoa coloque uma das extremidades contra suas costas. Ela poderá também, se preferir, permitir que dois espectadores fiquem cada um em uma extremidade, e ela tocando meramente o centro com os dedos. Em qualquer caso, ouve-se os sussurros vindo das trombetas da mesma forma. Agora, isso é feito em plena luz do dia, em qualquer lugar, mesmo ao ar livre. Eu investiguei esse fenômeno por sete horas no total, tentando todos os tipos de testes possíveis, mas não consegui obter nenhuma pista. Descobri que não era ventriloquismo, pois as vozes vinham realmente de dentro das trombetas; além disso, os ventríloquos não podem falar em sussurros. Presenciei sem sombra de dúvida (como muitos outros) que as vozes estavam realmente na trombeta.
    A informação que recebi dos sussurros estava correta em todos os casos. Eu nunca tinha visto essa senhora antes, nem tinha estado em Ohio antes disso. Agora, a produção de linguagem inteligível dentro destas trombetas à luz do dia, a três ou quatro pés (0,91cm a 1,21m) de distância do médium, considero mais maravilhosa do que qualquer outra coisa que já conheci. Agora tenho as trombetas, pois as comprei. Você pode me dizer como as palavras sussurradas foram produzidas?"
    Em uma carta subsequente, ele disse: "A descrição que eu dei a você não foi exagerada de forma alguma. A senhora é a esposa de um humilde fazendeiro e mora em uma obscura vila no interior. Ela morou lá toda a sua vida, criou uma grande família e teve muitas crianças. Ela nunca esteve a mais de vinte milhas (32,2 km) de sua casa e tem pouca educação. Ela é, no entanto, muito inteligente. Ela deu suas sessões por um longo tempo gratuitamente e, mais tarde, começou a cobrar dez centavos. Agora ela cobra um dólar, mas não insiste em nada.
    Ela pode usar um vidro de lamparina ou qualquer receptáculo fechado no lugar da trombeta; e eu também ouvi claramente as vozes saindo da boca de um violão que estava sobre a mesa. O violão também tocou sozinho na minha presença, com total autonomia, mas de forma tênue. Não havia  uma caixa de música dentro dele, como geralmente acontece em outros casos. Ela também fez com que a música soasse e cessasse na trombeta do lado de fora.
    Três de meus amigos mais íntimos a viram várias vezes. Dois deles estavam comigo na minha investigação. Eu conheço esta senhora há seis anos; e, finalmente, tendo ouvido tanto sobre ela, viajei seiscentas milhas (965,6 km) para vê-la em janeiro de 1905. A senhora muitas vezes falava com as pessoas na sala ao mesmo tempo que eu ouvia as vozes. Observei isso com muito cuidado. Às vezes, duas vozes diferentes sussurravam ao mesmo tempo, como se uma estivesse tentando ficar à frente da outra.
    É claro que sabemos como os médiuns costumam coletar informações, mas esta senhora não tinha como saber nada sobre mim; e ainda assim as vozes me disseram, corretamente, muitas coisas da minha vida privada. Entre aqueles que falaram comigo estava minha mãe, minha filha (morta há vinte e dois anos) e meu avô. Minha filha me contou onde eu morava, em que tipo de casa eu morava, o que seu irmão vivo estava fazendo, onde ela foi enterrada, etc. Um antigo professor de musica que tive, de quem não tinha notícias há mais de dez anos, anunciou-se e disse que gostaria de tocar para mim. Então ouvi sons sutis, mas distintos, de piano tocando na  trombeta, e meus amigos na sala também ouviram. Os sons eram como se estivesse ouvindo um piano pelo telefone. Meu pai e meu sogro falaram comigo; assim como um tio que eu não conhecia mas cuja existência eu posteriormente pude verificar. Minha mãe falou seu próprio nome completo, mas falhou ao dizer meu nome do meio. Ela falou "Albert", quando na verdade é "Augustus".
    Certa vez, ouvi uma voz alta na trombeta por um momento. Eu também ouvi em sua boca e garganta quando as vozes estavam falando, mas não consegui detectar nenhum som. Descobri que as posições das vozes na trombeta variavam, soando uma vez mais perto de uma extremidade e outra vez mais perto da outra extremidade. Eu tinha notado a força variável das vozes, e a senhora me contou sobre essa mudança de posição. Eu verifiquei isso ouvindo fora da trombeta quando outros a seguravam, e descobri que as vozes variavam um pé e meio (45,7 cm) na localização. Eu fiquei particularmente impressionado com a franqueza da senhora e com sua perfeita disposição para que eu testasse seus poderes de qualquer maneira que eu desejasse. Ela me deu todas as oportunidades para fazer tais testes, dando-me sete ou oito horas de seu tempo. Eu supunha ser um truque; mas com mais de quarenta anos de estudo de mágica, e com o conhecimento de todos os grandes mágicos, fui totalmente incapaz de sequer imaginar como isso poderia ser feito. É um truque ou é a obra de Sua Majestade Satânica.
    Agora eu acredito ter descoberto um médium tão bom quanto Home, e hesito em tornar público seu nome e endereço. Você entende, qualquer médium possuindo este segredo pensaria que sua fortuna está feita. Não sou médium, mas certamente quero o segredo. Se isso for um truque, não quero que o segredo seja dado ao mundo, mas desejo mantê-lo para uso privado. Caso esteja de acordo em assinar um contrato, obrigando-se a respeitar este desejo, e a não revelar o segredo da performance sem o meu consentimento, terei o maior prazer em fornecer-lhe o nome e o endereço da senhora. Espero que você me dê os resultados completos de quaisquer investigações que você venha a fazer. "
    Ao receber esta carta, assinei imediatamente e devolvi o contrato de acordo com o que foi exigido ao Sr. Parsons. Recebi em troca as informações tão cobiçadas. Estando agora livre para revelar todos os detalhes, para constar devo declarar que a senhora é a Sra. Elizabeth Blake, de Braderick, Ohio. Esta é uma pequena vila de poucas casas, nas margens do rio Ohio, ao norte de Huntington, West Virginia. Pode-se chegar a este local de Huntington, mais diretamente, por uma balsa a remo.
    Depois de receber essa informação, decidi tentar saber de outras fontes se o caso era realmente como descrito pelo Sr. Parsons. Mais ou menos nessa época, descobri que este cavalheiro é bem conhecido no mundo da mágica sob a alcunha de "Henry Hardin" e que é um negociante de segredos de mágica. Se eu tivesse recebido esse relato de outras fontes, daria pouco crédito, visto que investiguei tantos outros casos, e invariavelmente não encontrei nada além de truques. Mas aqui estava um estranho relato de um homem versado nas artes dos truques; ele próprio um especialista, alguém que não seria facilmente enganado. Certamente, esta, pelo ao menos, seria uma garantida investigação.
    Sempre fui muito cético, nunca acreditei na comunicação espiritual, telepatia, clarividência ou qualquer coisa do gênero; bem como a fenômenos físicos, tudo que eu tinha encontrado era muito banal e desprovido de mistério quando eu tive a oportunidade de ver por mim mesmo. Não pude deixar de pensar e ponderar; e me perguntando se, afinal, seria possível um ser existir nesta terra com quaisquer poderes fora do normal; ou com qualquer faculdade incomum a todo o resto. Decididamente, eu não poderia acreditar que tal coisa fosse possível, e ainda assim, como um mágico experiente poderia ser enganado com tal coisa? Fiquei muito confuso; e embora eu não tivesse fé na comunicação espiritual, decidi investigar mais.
    Escrevi uma carta ao professor de ciências da escola de Huntington, dizendo-lhe que conhecia um estranho caso de fenômenos psíquicos em sua vizinhança e propondo contratá-lo para investigá-lo para mim. Eu era membro da Society for Psychical Research e me ofereci para fornecer-lhe as credenciais adequadas, etc. Anexei um envelope selado, mas ele nem mesmo se importou em responder. Em seguida, escrevi diretamente para a Sra. Blake e a convidei para visitar minha casa. Eu disse a ela que era um homem de negócios de Omaha e me ofereci para fornecer referências sobre a minha posição. Também me ofereci para custear todas as despesas de sua viagem.

Primeira parte do texto de mesmo nome de David P. Abbott
Traduzido por Frater Ayon Excelsior
Segunda parte: clique aqui

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